Muitas vezes, eu aproveitava as viagens que fazia de trem com papai para discutir assuntos que estivessem me perturbando, já que em casa, tudo que eu perguntava era respondido pelas minhas tias. Certa vez - eu devia ter dez ou onze anos - interroguei-o acerca de um poema que havíamos lido na escola. Uma sentença falava sobre "um jovem cujo rosto não fora marcado pelo pecado do sexo". Eu me acanhara de perguntar à professora o que aquilo significava, e mamãe, quando a interroguei, ficara toda vermelha. Naquela época, nos princípios do século XX, nunca se conversava sobre sexo, nem mesmo em família.
A sentença ficara em minha mente. Pecado eu sabia, era algo que irritava por demais uma das minhas tias; sexo era a diferença entre meninos e meninas. Os dois reunidos, porém, eu não sabia o que vinha a ser. Foi assim que, sentada no trem ao lado de papai, perguntei-lhe de chofre:
- Pai, o que é "pecado do sexo"?
Ele olhou-me como sempre fazia ao responder uma pergunta, mas, para minha surpresa, não disse nada. Levantou-se, tirou a maleta do porta-volumes acima de nós, e colocou-a no chão.
- Quer carregá-la para mim, Corrie?
Pus-me de pé e peguei a alça. A maleta estava cheia de relógios e peças que ele comprara nesse dia.
- É muito pesada, disse.
- É mesmo, confirmou ele. E eu seria um péssimo pai se exigisse que minha filhinha carregasse todo esse peso. Com os conhecimentos dá-se o mesmo, Corrie. Algumas coisas são pesadas demais para as crianças. Quando você ficar maior, e mais forte, poderá suportá-las. Hoje, porém, tem que confiar em mim e deixar que eu as carregue para você.
Fiquei satisfeita; mais que satisfeita, fiquei em paz. Havia respostas para esta e todas as outras perguntas difíceis que eu tivesse, mas por agora, eu estava tranquila em entregá-las aos cuidados de meu pai.
- Trecho do Livro "O Refúgio Secreto", de Corrie ten Boom.
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