sexta-feira, 16 de março de 2012

Scarborough, A Baía de Robin Hood

A fim de viajar sob o mais estrito incógnito, Robin envergou um traje de camponês e foi com essa modesta aparência que chegou a Scarborough. Parou para descansar um momento à porta de um mísero casebre habitado pela viúva de um pescador e pediu-lhe hospitalidade. A boa velha recebeu amistosamente o nosso herói, e enquanto lhe servia a refeição contou-lhe as miúdas dificuldades da sua vida, dizendo-lhe que possuía um barco tripulado por três homens cuja manutenção era um pesado fardo, embora esses três homens fossem insuficientes para conduzir o barco e arrastá-lo para a praia quando estava carregado de peixe. 


Desejoso de matar o tempo de qualquer maneira, Robin Hood ofereceu-se à velha para integrar, a troco de um pequeno salário, o número dos pescadores, e a camponesa, encantada com as boas disposições do hóspede, aceitou da melhor vontade a sua oferta de serviços. 

— Como te chamas, meu gentil rapaz? — perguntou a velha quando os preparativos para a instalação de Robin Hood no casebre estavam terminados. 
— Uso o nome de Simão de Lee, minha cara senhora — respondeu Robin. 
— Então, Simão de Lee, amanhã porás mãos à obra, e se o ofício te convier poderemos ficar muito tempo juntos. 

Na manhã seguinte Robin Hood foi para o mar com os seus novos companheiros, mas somos forçados a dizer que, mau grado toda a sua força de vontade, ele que ignorava até os elementos primários da manobra, em nada pôde ser útil aos hábeis pescadores. Felizmente para o nosso amigo seus camaradas não eram más pessoas, e em vez de o censurarem pela sua ignorância contentaram-se com rir da idéia que ele tivera de trazer consigo as flechas e o arco. 

— Se estes marotos estivessem lá na floresta de Sherwood — pensava Robin, — não ririam tão facilmente à minha custa; mas, seja, cada qual no seu ofício; é claro que neste não me posso comparar a eles. Depois de terem enchido o barco de peixe até às bordas, os pescadores desfraldaram as velas e dirigiram-se para o molhe. De caminho avistaram uma pequena corveta francesa que navegava ao encontro deles. A corveta parecia ter pouca gente a bordo, mas em todo o caso os pescadores assustaram-se com a sua aproximação e consideraram-se perdidos. 

— Mas perdidos, por quê? — perguntou Robin. 
— Por que? És muito ingênuo! — respondeu um dos pescadores; — porque essa corveta pertence a homens inimigos da nossa nação, porque estamos em guerra com eles e porque se nos abordarem seremos aprisionados. 

— Espero que o não conseguirão; tentaremos defender-nos. 
— Que defesa poderemos opor-lhes? Eles são uns quinze e nós somos três! 
— Não contas então comigo, meu valente? — tornou Robin. 
— Não, meu rapaz; as tuas mãos são demasiado brancas para lhes teres algum dia esfolado a pele ao contacto do remo e do forcado. Além disso não conheces o mar, e se caísses à água haveria na terra um imbecil a menos. Não te zangues; és muito amável e eu estimo-te muito, mas a verdade é que não vales o pão que comes. Um leve sorriso aflorou aos lábios de Robin. 

— Eu não me ofendo facilmente — disse ele; — em todo o caso desejo dar vos a prova de que sirvo para alguma coisa num momento de perigo. Meu arco e minhas flechas vão tirar-vos de dificuldades. Amarrai-me ao mastro; preciso de ter a mão firme. Deixai depois que a corveta fique ao alcance das minhas flechas. 

Os pescadores obedeceram: Robin foi solidamente amarrado ao mastro grande, e de arco tenso esperou. Logo que a corveta se aproximou, Robin visou um homem que se achava à proa do navio e cravando-lhe uma flecha no pescoço derrubou-o sem vida no meio da coberta. Um segundo marinheiro teve a mesma sorte. Os pescadores, um momento assombrados pela surpresa e o contentamento, soltaram um brado de triunfo, e o que tinha autoridade sobre os companheiros designou a Robin o homem que estava ao leme da corveta. Robin derrubou-o tão facilmente quanto derrubara os dois outros. Os dois navios ficaram lado a lado; na corveta não restavam mais de dez homens e Robin não demorou em reduzir a três o número dos desgraçados franceses. Logo que os pescadores perceberam que não havia a bordo mais de três homens, resolveram apoderar-se do navio, o que foi tanto mais fácil quanto os franceses, vendo que toda a defesa era perigosa e inútil, levaram os braços ao ar e se entregaram à discrição. Os marinheiros puderam conservar a vida e regressar à França num barco de pesca. 

A corveta francesa era uma boa presa, pois trazia ao rei de França uma grande soma em dinheiro: doze mil libras. Não é preciso dizer que na posse desse inesperado tesouro, os bravos pescadores dirigiram àquele de quem se haviam rido poucas horas antes, as maiores desculpas; em seguida, com o mais nobre desinteresse declararam que a presa pertencia inteira a Robin, visto que ele sozinho decidira a vitória pela sua habilidade e a sua intrepidez. 

— Meus bons amigos — interveio Robin, — só a mim pertence o direito de resolver a questão, e aqui está como pretendo arranjar os nossos negócios: a metade da corveta e do seu conteúdo passará a ser propriedade da pobre viúva dona deste barco; o resto será dividido entre vós três. 

— Não, não — disseram os homens, — não consentiremos que te prives de um valor que adquiriste sem a ajuda de ninguém. O navio pertencete, e se quiseres seremos teus servidores. 

— Agradeço-vos, bravos rapazes — tornou Robin, — mas não posso aceitar esse testemunho do vosso devotamento. A partilha da corveta será feita de acordo com o meu desejo, e empregarei as dozes mil libras em mandar construir para vós e para os habitantes mais pobres da baía de Scarborough casas mais decentes que as que possuis. 

Os pescadores tentaram, mas inutilmente, modificar o projeto de Robin; tentaram persuadi-lo a que desse à viúva, aos pobres e a eles próprios uma quarta parte das doze mil libras, o que seria ainda assim uma grande generosidade, mas Robin não quis ouvir falar nisso e acabou por impor silêncio aos seus honestos companheiros. 

Robin Hood passou algumas semanas em meio à boa gente que a sua generosidade tornara tão feliz; depois, uma bela manhã, cansado do mar, faminto do desejo de rever o velho bosque e os seus caros companheiros, reuniu os pescadores e anunciou-lhes a sua partida. 

— Meus bons amigos — disse Robin, — separo-me de vós com o coração cheio de reconhecimento pelos cuidados e atenções de que me tendes cercado. Talvez nunca mais nos tornemos a ver; em todo o caso, desejo que conserveis uma boa lembrança daquele que foi vosso hóspede, do vosso amigo Robin Hood. Antes que os pescadores, boquiabertos de surpresa, tivessem tido tempo de recuperar o uso da palavra, Robin Hood desapareceu. Ainda hoje a pequena baía que abrigou sob o humilde teto das suas cabanas o célebre fora da lei, tem o nome de baía de Robin Hood.

- Trecho do Livro "Robin Hood, o Proscrito", de Alexandre Dumas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário