Veja em que tipo de mundo vivemos, diz o Pregador em Eclesiastes. Tire seus óculos cor-de-rosa, esfregue os olhos e olhe bem e longamente. O que você vê? Vê o cenário da vida determinado por ciclos periódicos na natureza que parecem não ter propósito. Vê sua forma fixada por tempos e circunstâncias sobre as quais não temos controle algum. Vê a morte chegando para todos, mais cedo ou mais tarde, e sua vinda não tem relação alguma com nenhum merecimento. Os homens morrem como os animais, tanto os bons como os maus, tanto os sábios como os ignorantes. Você vê o mal crescendo desmedidamente , os ímpios prosperando, mas não os justos.
Ao ver tudo isso, você percebe como a disposição que Deus dá aos acontecimentos é inescrutável; por mais que queira entender, você não consegue. Quanto maior for seu esforço para entender o propósito divino na decorrência normal dos acontecimentos, mais obcecado e oprimido ficará com a aparente falta de propósito de tudo, e mais tentado ficará ao concluir que a vida na verdade não tem razão de ser.
Entretanto, uma vez que você tenha concluído que não há de fato explicação aparente para nada, que "proveito" poderá encontrar então em qualquer esforço construtivo? Se a vida é sem sentido, também não possui valor algum. Nesse caso, qual a vantagem de trabalhar para criar coisas, desenvolver um negócio, ganhar dinheiro e até mesmo buscar a sabedoria se nada disso trará algum benefício? Se apenas o tornará motivo de inveja. Se você não poderá levar nenhuma dessas coisas consigo, e o que deixar aqui provavelmente será mal dirigido depois de sua partida. Que vantagem há, portanto, em suar e trabalhar tanto? Não deve todo o trabalho do ser humano ser julgado "inútil" e equivalente a "correr atrás do vento"?
É a esta conclusão pessimista, diz o pregador, que a expectativa otimista de descobrir o propósito divino em todas as coisas finalmente o levará. E é claro que ele está certo, pois o mundo em que vivemos é por sinal o tipo de lugar descrito. O Deus que rege tudo se esconde. Raramente este mundo se parece com um lugar dirigido pela Providência benevolente. Raramente parece haver um poder racional por trás dele. Repetidas vezes o que é sem valor sobrevive enquanto o valoroso perece. Seja realista, diz o pregador, enfrente os fatos, veja a vida como ela é. Você não terá a verdadeira sabedoria enquanto não fizer isso.
Mas, nesse caso, o que é sabedoria? O pregador nos ajudou a ver o que ela não é. Será que nos dará alguma orientação sobre o que é? Na verdade ele pelo menos nos dá um esboço: "Tema a Deus e obedeça aos seus mandamentos". Confie nele e obedeça-lhe, respeite-o e adore-o, seja humilde diante dele e nunca diga mais que o necessário e que pretende cumprir quando ora diante dele. Faça o bem; lembre-se de que Deus algum dia lhe pedirá contas. Evite então, mesmo em segredo, coisas das quais se envergonhará quando vierem à luz, no dia do juízo divino.
Viva no presente, e desfrute completamente sua condição; as alegrias de agora são boas dádivas divinas. Busque a graça para realizar corretamente qualquer coisa que a vida lhe ofereça e tenha prazer nesse trabalho. Deixe os resultados por conta de Deus; deixe a avaliação com ele; sua parte é usar todo o bom senso e criatividade a seu comando para explorar as oportunidades apresentadas. Esse é o caminho da sabedoria — sem dúvida um dos aspectos da vida de fé.
Qual é a base da sabedoria, o que a sustenta? A convicção de que o inescrutável Deus da providência é o sábio e gracioso Deus da criação e da redenção. Podemos estar seguros de que o Deus criador deste mundo tão complexo e maravilhosamente ordenado, que tirou seu povo do Egito e mais tarde o redimiu do poder do pecado e de Satanás, sabe o que está fazendo, mesmo que no momento mantenha a mão oculta. Podemos confiar e nos regozijar nele, mesmo quando não pudermos discernir seus caminhos.
- Trecho tirado do Livro "O Conhecimento de Deus", de J. I. Packer.
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